Sacadas e gafes dos intérpretes de um ex-presidente americano

Começam no minuto 4:20 deste vídeo (infelizmente sem legendas em português) duas histórias divertidas e ilustrativas sobre interpretação, contadas pelo ex-presidente americano Jimmy Carter, que faleceu em 29 de dezembro aos 100 anos.

Os dois episódios têm muito a ensinar sobre o ofício dos intérpretes – e sobre como esse trabalho fica melhor quando conta com a parceria de quem está sendo traduzido.

Algumas observações, que farão mais sentido para quem assistir ao vídeo antes:

· Piadas e trocadilhos são uma das coisas mais difíceis e perigosas de traduzir. Com frequência, é impossível transportar a graça do idioma original para o idioma de chegada, seja por diferenças linguísticas ou culturais intransponíveis. Por isso, sempre que um orador planeja contar uma piada para um público estrangeiro, é recomendável combinar antes com o intérprete. Assim, o profissional tem tempo para bolar uma tradução divertida, e pode também alertar o palestrante caso o humor seja inadequado ou ofensivo para a plateia do outro país. 

· Provavelmente foi esse o cenário enfrentado pelo intérprete que verteu a fala de Carter para o japonês. E a solução encontrada pelo colega foi ótima! Uma vez que a piada era impossível de traduzir, ou talvez inconveniente para o público de Osaka, ele simplesmente disse: “o presidente Carter contou uma história engraçada, e vocês precisam rir”. A situação toda ficou realmente cômica, e arrancou gargalhadas da plateia – para deleite do ilustre visitante. 

· Sobre o caso na Polônia, o livro “White House Interpreter”, de Harry Obst (intérprete de alemão de vários presidentes americanos) narra os bastidores desse deslize tradutório. A viagem de Carter a Varsóvia ocorreu em 29 de dezembro de 1977, e o Departamento de Estado não encontrou nenhum intérprete de polonês disponível às vésperas do réveillon. Recorreu então a Steven Seymour, que na verdade era tradutor de russo, mas havia passado alguns anos na Polônia e foi escalado para quebrar um galho. Seymour ficou mais de uma hora ao relento na pista do aeroporto de Varsóvia, debaixo de neve no gélido inverno polonês, à espera do Air Force One e do pronunciamento que o presidente faria ali mesmo, após pousar. O intérprete até tentou obter uma cópia do discurso de Carter, mas o pedido – essencial para uma boa tradução – foi negado pelos assessores do presidente. A combinação desastrosa (intérprete sem conhecimentos profundos da língua, ensopado e tiritando de frio, com péssimas condições de trabalho, e sem receber o discurso de antemão) deu no que deu: exausto e despreparado, Seymour traduziu “compromisso com o amor pela liberdade” por “compromisso com o amor livre”, diante de autoridades de um país extremamente católico. Imagine o vexame. 

· No mesmo livro, Obst conta que o embaraço vivido na Polônia acabou rendendo frutos para o Departamento de Serviços Linguísticos, em Washington: depois de anos batalhando por uma estrutura melhor, a Casa Branca finalmente entendeu que os tradutores precisavam de reforços (profissionais experientes em mais línguas, e não apenas quebra-galhos), e determinou que todos os discursos a ser interpretados tinham de ser enviados com antecedência para os intérpretes. Os linguistas passaram até a participar da redação dos pronunciamentos, uma vez que conheciam as culturas de diferentes países e podiam identificar frases com potencial de causar embaraços diplomáticos. 

· Voltando ao programa de David Letterman, chama atenção a forma como o entrevistador se refere à presença do intérprete na comitiva presidencial: “o senhor fica à mercê [grifo meu] do tradutor”, como se esse profissional fosse um carrasco ou um sequestrador, e a pessoa traduzida fosse um refém. Talvez seja possível inverter o raciocínio e dizer “o senhor tem a sorte de contar com um intérprete”. Ninguém é capaz de falar e entender todas as línguas do mundo, e muito menos tem essa obrigação. O trabalho do intérprete é justamente permitir a comunicação. Ele, mais do que ninguém, será compreensivo e generoso com quem não domina o idioma estrangeiro. 

· Finalmente: se você tem vergonha de não falar uma segunda língua, não se culpe. Você não está sozinho. Calcula-se que cerca de 40% da população mundial fala apenas o idioma materno – o equivalente a mais de três bilhões de seres humanos! Isso inclui a maioria dos presidentes americanos que, embora comandem o país mais poderoso do mundo, são quase todos monoglotas. É claro que aprender línguas estrangeiras é uma grande vantagem profissional, uma forma de abrir portas para pessoas e culturas, um jeito de tornar a vida mais rica e interessante. Mas, quando isso não é possível (por qualquer motivo que seja), tradutores e intérpretes profissionais – e, em alguns casos, ferramentas automáticas – existem para superar a barreira do idioma. Mesmo quando a piada é ruim.

Texto por: Beatriz Vellozo

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PAULO SILVEIRA

“Comecei a interpretar em 2003, no mesmo ano em que nasceu o meu filho: duas jornadas que me encantam, desafiam e me fizeram crescer imensamente. Antes disso, passei pelos cursos de Direito, Publicidade, me graduei em Artes Visuais, morei na Inglaterra, além de estadias prolongadas nos EUA, Argentina e Chile. Lecionei inglês durante 15 anos, enquanto me aventurava na tradução escrita. Depois de um tempo, prestei o concurso de tradutor juramentado e comecei a atuar na área. Alguns anos depois, fiz a formação em interpretação de conferências da PUC/SP e me apaixonei por essa profissão.

Com a interpretação, viajei pelo mundo, da Argentina a Singapura, América Latina, EUA, Oriente Médio. Tive a oportunidade de traduzir, entre outros, Bill Clinton, FHC, Michelle Obama, Javier Milei, Bernardinho, Vik Muniz, e até o ator Leonard Nimoy, o Dr. Spock na série Jornada nas Estrelas. Aprendi muito sobre o setor financeiro, a indústria farmacêutica, visitei frigoríficos, lavouras, centros de pesquisa agrícola, minas, laboratórios, plantas de papel e celulose, alumínio, parafusos, e do setor alimentício, só para citar os mais recorrentes. Acima de tudo, a interpretação me encanta pela possibilidade de criar um canal linguístico e cultural que permite a comunicação entre as pessoas como se estivessem falando o mesmo idioma.”

PAULO SILVEIRA

“Comecei a interpretar em 2003, no mesmo ano em que nasceu o meu filho: duas jornadas que me encantam, desafiam e me fizeram crescer imensamente. Antes disso, passei pelos cursos de Direito, Publicidade, me graduei em Artes Visuais, morei na Inglaterra, além de estadias prolongadas nos EUA, Argentina e Chile. Lecionei inglês durante 15 anos, enquanto me aventurava na tradução escrita. Depois de um tempo, prestei o concurso de tradutor juramentado e comecei a atuar na área. Alguns anos depois, fiz a formação em interpretação de conferências da PUC/SP e me apaixonei por essa profissão.

Com a interpretação, viajei pelo mundo, da Argentina a Singapura, América Latina, EUA, Oriente Médio. Tive a oportunidade de traduzir, entre outros, Bill Clinton, FHC, Michelle Obama, Javier Milei, Bernardinho, Vik Muniz, e até o ator Leonard Nimoy, o Dr. Spock na série Jornada nas Estrelas. Aprendi muito sobre o setor financeiro, a indústria farmacêutica, visitei frigoríficos, lavouras, centros de pesquisa agrícola, minas, laboratórios, plantas de papel e celulose, alumínio, parafusos, e do setor alimentício, só para citar os mais recorrentes. Acima de tudo, a interpretação me encanta pela possibilidade de criar um canal linguístico e cultural que permite a comunicação entre as pessoas como se estivessem falando o mesmo idioma.”

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Lucas de castro

“Meu primeiro trabalho como intérprete foi há 16 anos, após adquirir experiência trabalhando como tradutor em uma grande consultoria internacional no departamento de tradução e localização. Antes disso, tive passagens em funções na área de TI, eventos, e ensino de idiomas.

Antes de me dedicar à tradução simultânea em tempo integral, fiz o curso de formação da Associação Alumni, em São Paulo, que concluí em 2006. Em 2010 passei uma temporada na Austrália, uma experiência importante para aumentar minha compreensão de diferentes sotaques e culturas.

Como sócio da VOX, além de tradutor e intérprete, também lidero e participo de iniciativas de pesquisa e desenvolvimento de tecnologias aplicadas a todas as áreas de atuação da empresa, e de iniciativas na área de comunicação e marketing.

A diversidade de assuntos e lugares diferentes pelos quais a interpretação simultânea me permite transitar é uma das coisas que mais me atrai nessa carreira. Tive o privilégio e o prazer de interpretar pessoas das mais diversas áreas: diretores e gerentes de empresas, acadêmicos, autoridades governamentais como a rainha Sílvia e o rei Carl XVI Gustaf da Suécia, atores e diretores de televisão e cinema como Xuxa, Pablo Vittar, Buddy Valastro, Sérgio Loroza, jogadores como Cafú e treinadores de futebol, influencers, consumidores em pesquisas de mercado e etnográficas, publicitários, navegadores como Vilfredo, Heloísa e David Schurmann.”

Lucas de castro

“Meu primeiro trabalho como intérprete foi há 16 anos, após adquirir experiência trabalhando como tradutor em uma grande consultoria internacional no departamento de tradução e localização. Antes disso, tive passagens em funções na área de TI, eventos, e ensino de idiomas.

Antes de me dedicar à tradução simultânea em tempo integral, fiz o curso de formação da Associação Alumni, em São Paulo, que concluí em 2006. Em 2010 passei uma temporada na Austrália, uma experiência importante para aumentar minha compreensão de diferentes sotaques e culturas.

Como sócio da VOX, além de tradutor e intérprete, também lidero e participo de iniciativas de pesquisa e desenvolvimento de tecnologias aplicadas a todas as áreas de atuação da empresa, e de iniciativas na área de comunicação e marketing.

A diversidade de assuntos e lugares diferentes pelos quais a interpretação simultânea me permite transitar é uma das coisas que mais me atrai nessa carreira. Tive o privilégio e o prazer de interpretar pessoas das mais diversas áreas: diretores e gerentes de empresas, acadêmicos, autoridades governamentais como a rainha Sílvia e o rei Carl XVI Gustaf da Suécia, atores e diretores de televisão e cinema como Xuxa, Pablo Vittar, Buddy Valastro, Sérgio Loroza, jogadores como Cafú e treinadores de futebol, influencers, consumidores em pesquisas de mercado e etnográficas, publicitários, navegadores como Vilfredo, Heloísa e David Schurmann.”

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LARA MOAMMAR

“Atuo como intérprete profissional desde 1996. Sou formada pela Associação Alumni e pelo Middlebury Institute of International Studies, na Califórnia. Antes de iniciar a carreira como intérprete, estudei Psicopedagogia.

Além disso, minhas experiências em Quito, no Equador, e em Toronto, no Canadá – duas cidades onde morei na infância e adolescência –, me deram uma compreensão mais ampla da cultura latina e norte-americana. Esse conhecimento é extremamente valioso para meu trabalho como intérprete de português, espanhol e inglês.

Em diferentes ocasiões, tive a oportunidade de fazer a tradução simultânea para chefes de estado como Barack Obama, Bill Clinton, Fernando Henrique Cardoso e Tony Blair; calls de resultado, reuniões e pitches em IPO Roadshows na América do Norte e Europa; organizações internacionais e bancos de fomento como ONU, BID, Banco Mundial e FMI; treinamentos do FBI; professores, pesquisadores de ponta, cientistas, astronautas e astrofísicos da NASA e instituições como Harvard, MIT e Oxford: escritores, dramaturgos, músicos e cineastas; laboratórios farmacêuticos e congressos médicos; aulas de gastronomia, yoga e mindfulness; workshops com dirigentes e treinadores em estádios de futebol e quadras de tênis; auditorias em portos internacionais, e até a bordo de um navio cargueiro. É gratificante facilitar a comunicação multilíngue em contextos tão diversos, um verdadeiro privilégio.”

LARA MOAMMAR

“Atuo como intérprete profissional desde 1996. Sou formada pela Associação Alumni e pelo Middlebury Institute of International Studies, na Califórnia. Antes de iniciar a carreira como intérprete, estudei Psicopedagogia.

Além disso, minhas experiências em Quito, no Equador, e em Toronto, no Canadá – duas cidades onde morei na infância e adolescência –, me deram uma compreensão mais ampla da cultura latina e norte-americana. Esse conhecimento é extremamente valioso para meu trabalho como intérprete de português, espanhol e inglês.

Em diferentes ocasiões, tive a oportunidade de fazer a tradução simultânea para chefes de estado como Barack Obama, Bill Clinton, Fernando Henrique Cardoso e Tony Blair; calls de resultado, reuniões e pitches em IPO Roadshows na América do Norte e Europa; organizações internacionais e bancos de fomento como ONU, BID, Banco Mundial e FMI; treinamentos do FBI; professores, pesquisadores de ponta, cientistas, astronautas e astrofísicos da NASA e instituições como Harvard, MIT e Oxford: escritores, dramaturgos, músicos e cineastas; laboratórios farmacêuticos e congressos médicos; aulas de gastronomia, yoga e mindfulness; workshops com dirigentes e treinadores em estádios de futebol e quadras de tênis; auditorias em portos internacionais, e até a bordo de um navio cargueiro. É gratificante facilitar a comunicação multilíngue em contextos tão diversos, um verdadeiro privilégio.”

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Helena Nicotero

“Trabalho como intérprete de conferências desde o ano 2000, quando concluí a formação da Associação Alumni. Antes de me dedicar à área, porém, estudei outros temas: sou formada em Artes Plásticas (Escola Panamericana, SP) e também em Administração em Prestação de Serviços (Johnson & Wales University, EUA).

Esses conhecimentos diversos, somados à minha experiência fora do Brasil – além de cursar faculdade nos Estados Unidos, morei na África na adolescência –, me deram ferramentas importantes para trabalhar como tradutora: contato com diferentes culturas e formas de comunicação, jogo de cintura para lidar com imprevistos, atenção a diferentes entonações, gestos e sinais sutis (que também são formas de expressão).

A tarefa de servir como canal de comunicação entre orador e ouvinte é instigante, exige muita concentração e estudo. Além disso, o trabalho me dá a chance de traduzir pessoas de áreas tão diversas como Steve Wozniak (um dos fundadores da Apple), o tenista Gustavo Kuerten, o cineasta Arnaldo Jabor, o mediador de conflitos William Ury e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, entre outros. Tudo isso me atrai na profissão.”

Helena Nicotero

“Trabalho como intérprete de conferências desde o ano 2000, quando concluí a formação da Associação Alumni. Antes de me dedicar à área, porém, estudei outros temas: sou formada em Artes Plásticas (Escola Panamericana, SP) e também em Administração em Prestação de Serviços (Johnson & Wales University, EUA).

Esses conhecimentos diversos, somados à minha experiência fora do Brasil – além de cursar faculdade nos Estados Unidos, morei na África na adolescência –, me deram ferramentas importantes para trabalhar como tradutora: contato com diferentes culturas e formas de comunicação, jogo de cintura para lidar com imprevistos, atenção a diferentes entonações, gestos e sinais sutis (que também são formas de expressão).

A tarefa de servir como canal de comunicação entre orador e ouvinte é instigante, exige muita concentração e estudo. Além disso, o trabalho me dá a chance de traduzir pessoas de áreas tão diversas como Steve Wozniak (um dos fundadores da Apple), o tenista Gustavo Kuerten, o cineasta Arnaldo Jabor, o mediador de conflitos William Ury e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, entre outros. Tudo isso me atrai na profissão.”

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Beatriz Velloso

“Fui jornalista durante 15 anos, mas sempre fui apaixonada por idiomas e tradução. Em 2006, decidi trocar a redação de uma grande revista semanal pelas cabines de interpretação. Fiz o curso da PUC/SP de formação de intérpretes, aproveitei os conhecimentos de inglês adquiridos na adolescência, quando morei nos Estados Unidos, e parti para uma carreira na área.

Adoro a profissão porque ela me dá a possibilidade de estudar temas diversos e estar em contato com ‘feras’ em vários assuntos. Já interpretei, por exemplo, líderes indígenas como Davi Kopenawa Yanomami, o ex-presidente americano Barack Obama, o piloto de Fórmula 1 Lewis Hamilton e a cantora pop Demi Lovato, entre muitos outros. Fazer a tradução simultânea de pessoas anônimas é igualmente interessante: elas têm histórias e talentos que eu jamais conheceria se não fosse pelo meu trabalho. De quebra, circular entre diferentes línguas é ótima ginástica para o cérebro.”

Beatriz Velloso

“Fui jornalista durante 15 anos, mas sempre fui apaixonada por idiomas e tradução. Em 2006, decidi trocar a redação de uma grande revista semanal pelas cabines de interpretação. Fiz o curso da PUC/SP de formação de intérpretes, aproveitei os conhecimentos de inglês adquiridos na adolescência, quando morei nos Estados Unidos, e parti para uma carreira na área.

Adoro a profissão porque ela me dá a possibilidade de estudar temas diversos e estar em contato com ‘feras’ em vários assuntos. Já interpretei, por exemplo, líderes indígenas como Davi Kopenawa Yanomami, o ex-presidente americano Barack Obama, o piloto de Fórmula 1 Lewis Hamilton e a cantora pop Demi Lovato, entre muitos outros. Fazer a tradução simultânea de pessoas anônimas é igualmente interessante: elas têm histórias e talentos que eu jamais conheceria se não fosse pelo meu trabalho. De quebra, circular entre diferentes línguas é ótima ginástica para o cérebro.”

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